Eu estava em 28/07/2015 dentro de um avião retornando de férias com esposa e filha de 4 anos. Restavam duas horas e meia para pouso em Recife. Assistia a um filme no avião e subitamente uma forte dor rasgou algo dentro do peito esquerdo de baixo para cima. Este foi o momento exato que dividiu a história da minha vida em duas etapas.
Cada batida do coração eu ouvia e sentia um som “ploft, ploft, ploft” e decidi tomar um hipertensivo. Passei em casa, tomei um banho e fui procurar uma emergência. No início da madrugada passei por dois cardiologistas que ouviram, cada um em seu plantão, o meu relato. Ouviram o barulho no meu peito, informei de exames anteriores que informavam uma “ectasia de aorta”, porém normal ao corrigir pela superfície corporal. Fui liberado após os resultados dos exames de sangue com receita de Pantocal 40mg. No outro dia, um pouco de dor, nada sério, mas o ploft, ploft, ploft continuava. Ao deitar na cama de noite, percebi uma dor em forma de cruz nas costas e retornei para a cadeira onde passei o dia em repouso. Certa hora desta segunda madrugada percebi que eu estava perdendo tempo e que aquilo não era normal e era sim uma situação de emergência. A dor de uma dissecção de aorta e o barulho das camadas íntimas batendo, agora me parecem um diagnóstico claro que eu mesmo teria feito. Mas quem conhece que a aorta rasga?
Perto das 4 horas da madrugada fui para outro hospital. Repeti as mesmas informações da madrugada anterior. Acordei no dia seguinte cheio de fios com uma perna “engessada” sem saber que tipo de cirurgia afinal tinha feito. O ploft, ploft no peito mudou para TIC, TIC, TIC abaixo do ouvido direito. Dois mistérios pois achava que a cirurgia era algo no peito (estômago, coração ou quem sabe pulmão).
Depois soube que tinha feito uma cirurgia das mais complexas no coração, tirado uma safena e colocado uma válvula e turbo artificial na saída do coração. O quadro médico seguiu pelo caminho feliz nos dias seguintes. Já o quadro interior, do ser humano, rende um livro sobre resignação, fé e confiança nos desígnios de Deus. Tive 2 meses de licença médica, que foi muito pouco. Não temos direito às regras de PCD mas vamos ter prioridade na vacina do Covid-19.
Bem… Veja bem… Muita calma nesta hora… Abrir o peito para qualquer procedimento não é fácil não. Coração, pulmão, estômago, coluna e vértebras tem grandes amplitudes de movimento. Mas se for para escolher se uso este espaço para falar de corpo ou de alma, digo que a questão sai, e muito, de uma percepção só do corpo e pede uma alma mais resiliente e ligada nos propósitos imponderáveis da vida. A página da vida virou mesmo. Aquela viagem de férias em 2015 marcava um ponto de inflexão na minha história pessoal, mas achei que seria para uma vida sossegada que de fato escolhi não me permiti na primeira etapa da vida. Tem sido anos bem mais difíceis que antes de perder a saúde
física e abalar as estruturas da saúde da alma. Depois de 3 anos tive que voltar a usar avião e fiz as pazes com a pressão da cabine. A felicidade foi intensa mas pouco visível no mundo exterior.
Estou com 6 anos neste novo desafio. Quem passa por isso fica com um “tacógrafo” limitador de velocidade, uso da força e gasto instantâneo de energia. Ficam alguns sintomas físicos no equilíbrio, na visão, em dores, em diferentes eventos difíceis de separar entre o psico e o somático. Fica o monitoramento mais severo da pressão arterial, INR e consumo de vitamina K. Vários remédios, doses e horários. A notícia boa é que a cada ano melhora e que tem muitos casos que a pessoa tem uma vida quase igual a antes.
A máquina biológica de fato reclamou para convidar a alma a encontrar robustez, equilíbrio, melhores propósitos e eficiência de resultados na reforma íntima. Espero ser mais resistente às dores, ouvir melhor os recados da Vida para aprimorar a paciência, empatia, amor ao próximo e fé em Deus. Reduzir minhas parcelas de vaidade, orgulho, inveja e egoísmo. E muito importante: ajustar minha ansiedade e necessidade de acertar sempre a combinação mais perfeita nas coisas da vida.
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